TEXTO DO SR. BISPO
O MÁXIMO, O MÁXIMO DOS MÁXIMOS
Tive um professor que sabia muito, muito mesmo, como todos quantos se impunham pelo seu saber. A garotada, porém, por vezes, duvidava se ele saberia tanto quanto se esforçava por dar a entender que sabia. No entanto, das nossas águas-furtadas nunca saltitava qualquer ideia ou apetite de o testar. Rufias e traquinas em jeito de bem comportados, íamos gerindo a situação de forma à boa convivência e ao equilíbrio dos rankings individuais, nem sempre famosos, quase sempre parcos.Tinha pose de intocável e distante mas não era tanto assim. Usava gestos proverbiais e um corte de cabelo não à pank mas de linhas raras ao tempo, sobretudo no enfileiramento dos cantos. O sério dele nem sempre se conjugava com o nosso. Assim acontecia, por exemplo, quando, com epítetos de grandeza e excelência, gostava de qualificar alguns autores católicos de antanho. Recorda-me, de momento, que os três capadócios - assim chamados por serem das bandas da Capadócia -, um era o máximo, outro o máximo dos máximos e o outro já não me recorda bem qual a grandeza do seu máximo. Um era a cabeça que pensava, outro a boca que falava, outro o braço que agia. Na aula seguinte, porém, por vezes, vinha o melhor para a nossa safadeza e o pior para os capadócios. A ordem era trocada, os seus epítetos baralhados e os capadócios lá ficavam a contas com as suas promoções e despromoções, sem qualquer pio parenético a justificar tamanha honra e desonra.
Recordei isto quando, nestas três semanas, quis tornar presente alguma coisa, pouquíssima coisa mesmo, sobre o perfil cristão dos pais da Europa: Schuman, Adenauer e De Gasperi. De facto, qual deles o maior ou o máximo no recolher das sobras de tanta tragédia fascista e nazista? Qual deles o maior no seu engenho e arte de valorizar esses trapos e cacos, os tornar esperançosos e apetecíveis para rasgar horizontes e construir pontes que unissem e construíssem comunidade? Qual deles o maior em sabedoria e destreza política, em humildade e persistência, em honestidade e sentido do bem comum, em serviço despretensioso à causa dos povos tão sofridos e martirizados pela guerra?
Os três viviam, anunciavam e aplicavam o que o cristianismo lhes ensinara: “a igualdade natural de todos os homens, filhos do mesmo Deus, resgatados pelo mesmo Cristo, sem distinção de raça, de cor, de classe ou de profissão”. Valorizavam a pessoa, a família, “a dignidade do trabalho”, “a supremacia dos valores interiores”, “a lei universal do amor e da caridade” sobre a qual se baseiam as relações sociais, o progresso e a sadia convivência. Eles sabiam que a verdadeira revolução “aconteceu sob a inspiração progressiva do Evangelho” e que essa inspiração continuava a ser necessária para que todos pudessem viver com dignidade, alegria e esperança, comprometidos com a sorte do mundo e o bem-estar humano.
Admiravam a Doutrina Social da Igreja. Nela viam um grandioso programa de bem-fazer, saudável e promissor para todos, com um potencial de ação incomparável. Sem viverem plenamente o Concílio Vaticano II que decorreu de dezembro de 1961 a dezembro de 1965, dele foram verdadeiros precursores e subscreveriam, sem dúvida, com alegria e plena convicção, a Mensagem final que os participantes no Concílio dirigiram a todos os governantes: ”…dirigimo-nos com respeito e confiança àqueles que têm nas suas mãos o destino dos homens na terra, a todos os depositários do poder temporal. Nós proclamamos em voz alta: prestamos honra à vossa autoridade e à vossa sabedoria; respeitamos o vosso cargo; reconhecemos as vossas leis justas; estimamos aqueles que as fazem e aqueles que as aplicam. Mas temos uma palavra sagrada a dizer-vos, e é esta: só Deus é grande. Só Deus é o princípio e o fim. Só Deus é a fonte da vossa autoridade e o fundamento das vossas leis. Pertence-vos ser na terra os promotores da ordem e da paz entre os homens. Mas não esqueçais: é Deus, o Deus vivo e verdadeiro, que é o Pai dos homens. E foi Cristo, o seu filho eterno, que nos veio dizer e ensinar que somos todos irmãos. É Ele o grande artífice da ordem e da paz na terra, porque é Ele quem dirige a história humana e o único que pode levar os corações a renunciar às más paixões que geram a guerra e a infelicidade…” Os pais da Europa viveram nesta onda, com humildade, fé e respeito por tão sublime missão ao serviço do povo, dum povo a quem Deus ama e acompanha e do qual não se sentiam donos nem senhores, mas humildes e simples servidores.
ANTONINO DIAS