Saudade
A filosofia de Mário Pissarra!
Certa ocasião quando jovem, na Alemanha (RDF), vendo-me acabrunhado e triste, a simpática Sr.ª Rosa Hilgert perguntou-me se tinha saudades (Heimveh nach) de Portugal e da família. Respondi-lhe cortesmente, mas não lhe pude explicar. A minha simpatia e curiosidade nunca se alimentaram com as preocupações e discursos autofágicos da portugalidade e o seu oscilar entre um pólo saudosista e nostálgico de um sebastianismo enevoado e um esperançoso V.º Império de um sapateiro de Trancoso ou do mestre da língua portuguesa, o Pe. António Vieira.
Velhos do Restelo e outros tipos de saudosistas, carpidores do presente e desesperados com o futuro não entram na minha mala de viagem. Também dispenso os visionários utópicos de todas as espécies. Picou-me uma bicha chamada Simone Beauvoir que na Sabedoria das Nações apresentou uma ideia que me seduziu: os europeus passam o tempo a equacionar problemas; os americanos resolvem-nos. Sempre tive a sensação que muitos portugueses se comprazem com questões e teorias perfeitamente improdutivas. Alimentando-se com o sonho de um passado glorioso (que nunca ou pouco o foi) e uma esperança de um futuro risonho (de cumprir uma missão), perdem parte das energias necessárias para a construção de um presente que valha a pena.
Este irrealismo lírico torna-nos os eternos insatisfeitos, os eternos críticos do que quer que se faça, sempre prontos a fugir da tarefa de todos – construir Portugal - , perdendo-nos entre o omnipresente saudosismo e a promessa e esperança que nunca chegam.
Deixo-lhes dois poemas que muito aprecio sobre o tema: Saudade. O primeiro, é da Florbela Espanca; o segundo, de uma canção popular açoriana da ilha Terceira.
Há uma palavra na terra
Que tem encantos de céu;
Não é amor, nem esperança,
Nem sequer o nome teu.
Essa palavra tão doce,
De tanta suavidade,
Que me faz chorar de dor
Quando a murmuro: é saudade.
A saudade é um luto
Uma dor, uma paixão;
É um cortinado roxo
Que me cobre o coração.
Espero que a coberta do vosso coração seja de cores fortes e quentes e que, se chorar, que o façam por alegria ou graça.
Mário Pissarra