PADRE HORÁCIO - TESTEMUNHOS
O P. Horácio marcou a minha juventude
Como aluno do P. Horácio, muito singelamente, desejo recordar a minha, ainda que breve relação com ele, em plena juventude. Em meados dos anos cinquenta (1957-1958), frequentando o seminário de Alcains, tive a sorte e o prazer de conhecer e acompanhar um pouco os dias do p. Horácio.
Na memória, ficaram-me algumas felizes recordações deste Homem que, para mim, viveu antes do seu tempo. A sua alargada e moderna visão da relação da Igreja com o Mundo em mudança, nos pós-guerra, marcaria a sua vida nos anos cinquenta. Pré anunciando o Vaticano II. Daqui, talvez incompreendido, muito marcaria o seu sofrimento interior. Não cabia na fechada Igreja do seu tempo. Nem na clausura de um seminário.
Toda a sua luta, falo do que observei, foi um contínuo desafio à abertura à comunidade, à alegria de viver, ao convívio sorridente, com os seus numerosos amigos.
A ele devo a minha inclinação para a música, metendo-me nas mãos um violino que eu dedilhava nos recreios da noite. Do mesmo modo, o contacto com a poesia. A este propósito, lembro-me de ele me convidar a declamar uns versos seus “não entendo o que estou vendo” no lançamento da primeira pedra das obras do novo bloco do seminário de Alcains. No seu quarto me ensinou a colocar a voz e a dicção do poema, eivado de uma ponta de ironia. Sempre, com um espontâneo sorriso, na sua simplicidade e alegria natural, convivia connosco nos recreios, debitando umas charadas irónicas que nos faziam sorrir.
A este propósito, contava-me o meu prefeito que o padre Horácio nunca lavava as uvas no copo de água. Perguntando-lhe porque não o fazia. Respondeu. Prefiro comer as uvas com pó do que com lama.
Não posso esquecer as canções que nos ensinava, bem como as suas deslocações ao orfeão de Castelo Branco que tantos anos regeu, com sábia mestria.
Quando vinha passar férias à metrópole - vivia então em Malange- Angola- nunca deixava de passar por Alcains onde deixou muitos amigos que nunca esqueceu. Dos seus belos livros, outros o farão melhor do que eu.
Para mim, foi um sacerdote modelo que me desafiava, em plena juventude, para os grandes valores humanos. Se a nossa diocese perdeu – vamos lá saber porquê – este homem e este sacerdote tão ilustre, Angola muito ganhou com a sua presença missionária, ao longo de tantos anos.
Paz à sua alma.
Florentino Beirão