Mais uma deliciosa história do nosso cronista de Cascais! AH
Se os meus muito estimados colegas do Seminário de Alcains se lembram, o campo do recreio situava-se na parte poente do edifício. Do lado mais a norte, junto ao muro da rua, era o espaço para os alunos do 4º, e 5º e, parece-me também, para os do 6.º ano. Ao lado, pegado, a sul, era o espaço para os restantes anos. Nunca nos misturávamos.
E era no recreio dos mais novos, onde jogávamos principalmente ao voleibol, que havia uma parede, género cômoro, a todo o comprimento, onde nos sentávamos aqueles que não jogavam.
Num dia em que não me apeteceu jogar e digo não me apeteceu porque, sem vaidade, eu até dava uns bons toques naquele jogo do volei. Por sinal, fiz parte do "team" do ISA de Castelo Branco para o torneio regional inter-escolas.
Dizia eu que sentado, nesse dia, na referida parede, tive necessidade de acertar o atacador de um dos meus sapatos, mas não sei porquê, antes de proceder ao trabalho, coloquei o atacador no meu pescoço.
Distraído a ver jogar, fui mexendo no atacador e ao apertá-lo ao pescoço, sem intenção, verifiquei que a vista ficava turva. Apertava, desapertava e assentei o meu olhar num poste de electricidade que se situava dentro do terreno do vizinho, junto à parede divisória, e ao apertar, novamente, começava a ver dois postes.
Estava ao meu lado um colega do meu ano, o Vasco Santos, que me parece ser natural de Alcafozes, moço muito franzino com pouca actividade física, e disse-lhe: - ó Vasco, diz-me lá se também vês dois postes se eu te apertar este atacador no teu pescoço?
Dada a sua anuência, passei-lhe o atacador pelo pescoço, fui apertando, apertando, à espera que ele me confirmasse a visão dupla do poste, mas não teve tempo, caindo, redondo, para a frente, desmaiado.
Gerou-se pânico em todos nós, sem saber o que fazer. Estava por perto o Padre José Ribeiro que chamámos e correu de imediato.
O Vasco foi reagindo e levado em "cadeirinha" para dentro do Seminário e passado algum tempo estava restabelecido.
E foi nesse dia que recebemos uma lição, não programada, de anatomia, dada pelo Padre Ribeiro, elucidando-nos que a brincadeira provocava o aperto das carótidas, deixando de alimentar de sangue e oxigénio o cérebro e isso provocava a morte.
Foi um dos maiores sustos que tive na minha juventude e que ainda hoje me vem por vezes à memória.