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Animus Semper

Associação dos Antigos Alunos dos Seminários da Diocese de Portalegre e Castelo Branco

Migrações na Europa (2)

22.07.18 | asal

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 A primeira globalização

 

Cansado de percorrer densas e perigosas florestas, para abater animais para se alimentar, o “homo sapiens” quis experimentar outro modo de vida. Para não andar de trouxa às costas, de gruta em gruta, foi-se fixando no mesmo lugar, afeiçoando-se à terra mãe - à agricultura - evoluindo para uma vida sedentária. Não tardou que, lentamente, experienciasse as vantagens desta sua opção. Deste modo, cada vez mais, foi deixando de perseguir os ferozes animais selvagens, apostando, cada vez mais, em produzir os alimentos que o cultivo da terra lhe proporcionava.

Na milenar história do “homo sapiens”, tratou-se de um choque cultural total. Esta radical mudança – a revolução neolítica - só surgiu muito recentemente, há cerca de 12 mil anos. Consolidada a agricultura, por volta de 6.500 anos, a.C., deu-se uma forte migração para a Europa, oriunda do próximo - oriente, passando pela Grécia e pelo sul dos balcãs, de agro - pastores oriundos do crescente fértil, hoje o martirizado Iraque. Como sem água não há agricultura, os primeiros povoados foram-se construindo e desenvolvendo junto aos rios da Mesopotâmia, entre o rio Tigre e Eufrates. Nestas terras férteis, as populações já sedentarizadas, promoveram um elevado processo civilizacional – criando a escrita cuneiforme – e obras de arte que ainda hoje podemos admirar.

Estas populações que foram emigrando para a Europa e para o espaço em volta do Mediterrâneo, trouxeram consigo a sua civilização ligada à produção agrícola. Deste modo, as populações já podiam fazer provisões e gerir os alimentos, em períodos de maior carestia.

Se a atração pelo desconhecido faz parte visceral da nossa espécie, os cientistas explicam as migrações pelo “boom” demográfico e pela crise territorial, geradas pela domesticação dos cereais e de alguns animais domésticos, por volta de 10 mil anos a.C.. Acrescentam ainda o facto da fecundidade das mulheres sedentárias ser três vezes superior às do paleolítico. Deste modo, como as bocas para alimentar iam crescendo, exigiam-se novos espaços para a produção de uma maior quantidade de alimentos.

Por imperativo deste novo contexto histórico, as terras cultiváveis tornaram-se diminutas, por volta de 8.000 a.C., para estas populações, já portadoras de uma economia e cultura muito desenvolvidas. A resposta, para estes novos desafios, foi encontrada na Europa. À Península Ibérica, o período neolítico, ligado à agricultura, terá chegado por volta de 5.600 a. C.. Com esta vaga de migrações vieram as sementes, os animais já domesticados e os processos agrícolas já experimentados com sucesso, nas suas terras de origem.

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Os primeiros aldeamentos sedentários na Europa encontram-se datados de 5.300 a.C. e as sepulturas megalíticas, perto dos aldeamentos, de 4.500 a.C.. Os vasos de cerâmica ornados, da zona mediterrânica, já eram fabricados por volta de 6.000 a.C. e, em 3.000 a.C., iniciou-se a idade dos metais, com a descoberta do cobre. Em poucos milénios, aconteceram mudanças tão profundas na vida das populações que muito determinariam o seu desenvolvimento futuro.

Para os investigadores deste período, é tida como saudável, feliz e rica a assimilação destes povos oriundos do médio - oriente para a Europa, uma vez que trouxeram consigo uma cultura avançada, já com uma organização social hierarquizada.

Este fenómeno de assimilação, entre modos de vida diferentes, acabou por fazer aumentar a população da Europa central e ocidental, temperada e mediterrânica que, passadas algumas gerações, as populações sedentárias e agrícolas, por volta de 4.500 a.C., já ocupavam boa parte do espaço europeu que assim se manteria à base da agricultura, até à revolução Industrial do séc. XVIII.

Hoje, sabe-se que, nem tudo foi positivo com a chegada destes povos sedentários. Vivendo em promiscuidade com os animais domesticados, por falta de higiene, eram contagiados por agentes patogénicos que transmitiam várias doenças. Por outro lado, de um modo positivo, a Europa, longe de ser homogénea foi-se adaptando aos espaços e aos recursos disponíveis. Como resultado, nasceu uma diversidade de culturas materiais, com culturas regionais específicas: habitação, gastronomia, arte, técnicas de fabrico, folclore e artesanato. Esta realidade multifacetada daria origem ao comércio entre povos e trocas culturais enriquecedoras. Para alguns, trata-se já duma primeira globalização, no mundo então conhecido. Deste modo, a velha Europa se ia tornando terra de migrações.

florentinobeirao@hotmail.com