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Animus Semper

Associação dos Antigos Alunos dos Seminários da Diocese de Portalegre e Castelo Branco

JOAQUIM MANSO

16.09.16 | asal

FOME E SEDE DE JUSTIÇA

Portalegre 19-05-2012 106.jpg
Há personalidades e efemérides a elas ligadas que se perderam na memória dos tempos. Mesmo que sejam tempos curtos…
Joaquim MANSO é um desses casos. Nasceu em Cardigos, a 16 de Novembro de 1878 e faleceu em Lisboa a 10 de Setembro de 1956. Oriundo de família modesta, ficou órfão ainda muito novo e sua mãe escolheu-o, como mais velho, para seguir a carreira eclesiástica. Entrou no seminário diocesano e foi ordenado padre.
Com a implantação da República solicitou a redução ao estado laical e matriculou-se na Universidade de Coimbra, onde foi condiscípulo de Oliveira Salazar e onde concluiu o curso de Direito .Foi advogado, professor, governador civil de Vila Real em 1914 (num período muito conturbado em Trás os Montes devido a questões políticas), secretário de Bernardino Machado, ao tempo Ministro dos Negócios Estrangeiros, e escritor. Nesta qualidade deixou uma obra notável ainda que muito esquecida: Alma Inquieta, O Efémero e o Eterno, O Fulgor das Cidades, O Livro das Moralidades, Fábulas, Pedras para a Construção do Mundo, Primavera de Lenda, Malícia Sem Maldade, Consciência Nua e Abandonada, Cartas a João Venâncio, Os Amores de Pedro e Inês e Oração à Raça, Manuel e muitos outros.Foi conferencista reconhecido e muito solicitado, membro da Academia das Ciências e da Sociedade de Geografia de Lisboa, mas foi como jornalista que mais se destacou.

O primeiro grande jornal em que trabalhou, de 1914 a 1920, foi em “A Capital”. Em 1920 entra no jornal “A Pátria” como redactor principal.

to.jpgA 7 de Abril de 1921 fundou o “Diário de Lisboa” (DL) que viria a ocupar um lugar de destaque no panorama da imprensa escrita portuguesa. Considerado um jornal para ser lido por uma elite democrática e republicana e discutido nas tertúlias do Chiado e do café Martinho, o DL nunca esqueceu a defesa das classes mais desfavorecidas e a promoção das populações rurais do interior do país. (Recordo que constitui uma boa fonte para o estudo da História de Cardigos pelas muitas locais que referem a freguesia natal do fundador.)
O DL era um vespertino destinado a ser lido ao final da tarde e à noite e foi o primeiro jornal português a adoptar a impressão a chumbo e o formato tablóide, mais manuseável e de mais fácil leitura. Influenciou dezenas de jornais da imprensa local e regional que lhe adoptaram o formato e o grafismo.
Joaquim Manso esteve 35 anos à frente do DL. No primeiro número escrevia: “Não traz consigo o Diário de Lisboa outro programa senão este – erguer Portugal acima da misérias e fraquezas dos homens a fim de que seja para todos nós o maior facto do nosso esforço e do nosso espírito (…) O Diário Lisboa será um jornal moderado …”
Amigo de longa data de Amadeu Gaudêncio, nazareno de cepa, Joaquim Manso apaixonou-se pela vila da Nazaré onde construiu uma casa de férias, hoje transformada em Casa Museu Etnográfico e Arqueológico.

to1.jpgEm Cardigos, quase ninguém ouviu falar nele. Os mais velhos morreram e os novos, com poucas excepções, desconhecem que existiu e quem foi. (Recordo que o Dr. Rui NUNES, Prof. de História, natural do Casalinho, fez um excelente trabalho de pesquisa para a sua licenciatura: “JOAQUIM MARTINS MANSO. Simplesmente um Homem”.)
No pretérito dia 10 de Setembro assinalaram-se os 60 anos do seu falecimento, em Lisboa. Em jeito de homenagem, transcreve-se aqui uma passagem de uma das suas obras: Livro de Moralidades, Livraria Aillaud e Bertrand, s.d., pp 43 e 44: “Já temos pensado que se os homens um dia se decidissem a falar verdade quatro minutos a fio, que se dava uma destas revoluções maiores que o dilúvio. As torres cairiam e as pontes romper-se-iam, sobre as torrentes. A poesia desfazia-se em pó e a beleza, talvez, mostrasse a sua caveira feita de torpeza. Os vilões vomitariam toda a sua velhacaria e os traidores toda a semente de traição. Os larápios muitas vezes mostrariam ter mais direito ao que roubaram que os próprios proprietários. Os avarentos estalariam sobre as suas burras e os rábulas ficariam presos dentro da sua rabulice. Mas, sobretudo a raça dos políticos sumia-se com todo o seu cortejo de tramóias e trampolinices. Os crânios dos nossos financeiros ficariam devastados como as árvores do Outono, depois de bem vergastadas pela ventania. Os tribunos emudeceriam, suspensos na morte, como o soldado de Pompeia. E os humildes seriam então escutados na sua fome e sede de justiça.”

António Manuel Silva

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