Estados Desunidos da América
Eleições não afastam pesadelo
Terminada que está a contagem dos votos das últimas eleições nos Estados Unidos da América, o democrata e católico Joe Biden foi o claro vencedor. Só que, pasme-se, o republicano vencido, o presidente Donald Trump, na sua empedernida casmurrice, não se deu por vencido, acusando os democratas de lhe terem roubado votos. Persistindo nesta falsidade, vai continuando a incendiar os seus fanatizados fãs, sustentando a sua suposta vitória. Com esta falta de sentido democrático, tem procurado arrastar a sua declaração de candidato vencedor. Esta situação acontece porque, quanto a nós, a democracia dos Estados Unidos, o país mais rico e poderoso do mundo, se encontrar doente com o seu corpo fraturado. Negando os resultados das eleições, o candidato republicano - impreparado, boçal, autocrático e fanfarrão, ao longo da sua administração foi espalhando a sua ideologia por alguns países do globo que o têm vindo a imitar. Contradizendo-se continuamente, inventando falsas notícias, encerrado no seu nacionalismo fechado e tacanho, não acreditando na ciência face à atual mortífera pandemia, tem-se vindo a arrastar penosamente, numa confrangedora farsa política. Por incrível que pareça, ainda conseguiu 67 milhões de votos, deixando o seu país num pesadelo e em penosa convalescença. É neste contexto, com os Estados Unidos divididos que o vencedor das eleições, o experiente e pacificador J. Biden, terá que lidar nos próximos anos, como o primeiro responsável da maior potência mundial.
Esta tarefa não lhe será fácil de desempenhar, dado que o seu país contém no seu seio vastas camadas de trabalhadores rurais desfavorecidas e muitos a viver nos subúrbios das cidades, em estado de pobreza, sem fácil acesso aos serviços de saúde. Um vasto campo de pessoas onde os populismos medram facilmente, a tolerância política e social se dilui e a democracia vegeta. Sabe-se ainda que na América existe 1% de grandes capitalistas a controlar 40% de toda a riqueza nacional. Numa sociedade tão desigual, será uma difícil e complexa tarefa para Biden, se quiser alterar esta explosiva situação e tentar resolver com determinação e muita sabedoria política, o mais rápido possível, os graves e concretos problemas com que hoje se debate uma grande parte da população do seu país.
Por outro lado, é bem possível que o derrotado Trump possa ainda querer continuar a andar por aí, ativo politicamente e na televisão, com o seu populismo demagógico, a atiçar os seus devotos, numa onda contínua de elevada emoção popular, junto dos mais pobres e iletrados americanos. Por isso, os seus tiques antidemocráticos, só poderão ser derrotados se a nova Administração da USA, conseguir responder aos principais e concretos problemas dos cidadãos, explicando-lhes, de modo transparente, as razões da sua estratégia que deve nortear-se pelo bem-comum.
Seria louvável que a atual crise da ferida democracia americana também possa servir de lição para outras democracias, ameaçadas nos últimos tempos, por uma vaga de partidos populistas e xenófobos, a alastrar em vários países.
Espera-se agora que o vitorioso J. Biden, para onde muitos olhares se viram, com a tomada de posse marcada para 20.01.2021, seja uma luz forte, para o nosso ensombrado mundo.
Mas quem é J. Biden, acabado de ser eleito? Foi Vice-Presidente na administração Obama, e politicamente, é considerado uma personalidade moderada. Teimoso nas suas convicções, muito sofrido familiarmente, prometeu unir os americanos e retomar as anteriores grandes linhas políticas e sociais, combatidas ou destruídas no último mandato, tanto na política interna como na externa.
Escolhendo para sua vice-presidente Kamala Harris, uma negra elegante e muito jovem, filha de emigrantes, já deu um claro sinal de que vai tentar virar a página da xenofobia e do racismo, na qual a América vive mergulhada.
A nível internacional, a principal tarefa da nova Administração de Biden deve consistir em encontrar um equilíbrio entre o excessivo intervencionismo e a abdicação dos assuntos mundiais, ajudando a recriar uma nova ordem internacional, dialogando com o maior número de Estados, a começar pelas grandes potências.
O facto de Biden já ter avançado que, com ele, os Estados Unidos iriam regressar ao Acordo de Paris sobre as alterações climáticas e reatar os laços com a Organização Mundial de Saúde, para fazer guerra à Covid.19 e ainda restabelecer relações com a ONU e a NATO, é encorajador. É todo um novo programa que se anuncia, embora o anterior pesadelo não esteja afastado totalmente.
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