O Zé Maria Lopes continua a trazer novidades e interesse ao blogue. Obrigadinho, amigo! AH
Li há dias (atrás, nunca) num jornal diário esta simples notícia:
"Na edição de ontem imputámos, erradamente, a responsabilidade de falta de médicos no concelho de Peniche à ARS de Lisboa. Apresentamos as nossas desculpas a Rosa Marques e aos leitores".
Este comunicado, saído da redacção dum jornal, naturalmente com revisores ao seu serviço, vejam bem, tem um erro crasso que aos olhos de muitos de nós não se consegue detectar.
Antes de o revelar, peço aos nossos leitores que párem aqui a leitura e pensem para ver se o conseguem encontrar.
Agora que já pensaram e releram o comunicado, retomando-se a leitura, sou eu, então, a explicar o erro àqueles que o não detectaram.
Diz assim o comunicado quase na parte final: ."...apresentamos as nossas desculpas".
Como todos sabemos, as pessoas não podem tirar, a si mesmas, as culpas dum determinado acto que praticaram, senão não seria preciso haver tribunais e juízes, isto é, a pessoa desculpava-se a si mesma e o assunto ficava arrumado. Nem havia nunca a necessidade de tirar um atestado de registo criminal porque não havia registo de crimes praticados.
Sendo assim, os comunicados ou notícias deste ou doutro teor parecido têm de ter, impreterivelmente, as palavras "PEDIDO" ou tempos do verbo "PEDIR":
- apresentamos o nosso PEDIDO de desculpa/as;
- PEDIMOS desculpa/as;
- PEÇO desculpa/as.
Podem os eruditos dizer que se subentendem as palavras PEDIDO, PEDIMOS, PEÇO, mas em português não há regra gramatical, que eu saiba, que o admita.
Quanto a este tema, fico-me por aqui.
Agora, um segundo tema que sempre me deu que pensar, já que acima falei de palavra subentende. Perguntei a um dos meus mestres de Língua Portuguesa se os cartazes que, habitualmente, vemos afixados nas paredes dos prédios "ALUGA-SE QUARTOS" estavam correctos, gramaticalmente.
Respondeu-me que estariam correctos se subentendêssemos o advérbio de lugar "AQUI" no princípio da frase e seria, então, "AQUI aluga-se quartos", dado que o AQUI servia de sujeito no singular, mas, creiam, sempre fiquei com muitas dúvidas até hoje.
Se estes dois temas que aqui apresento constituírem um mote para melhor esclarecimento, podem os nossos muito estimados leitores dar a sua opinião no nosso ANIMUS. É uma ideia que fica.
Meu amigo, em relação ao primeiro tema, nada acrescento. Quanto ao segundo, o Pires Antunes já opinou com muita sabedoria, mas eu ainda digo mais umas coisas. 1 - O aqui a servir de sujeito não faz sentido naquela frase, pois tem uma conotação de "lugar onde...". Se queres usá-lo como sujeito, só nesta frase: aqui é um advérbio de lugar, pois é dele que se fala (o sujeito é de quem se fala!). 2 - Quanto ao "aluga-se quartos" ou "vendem-se casas", eu teimo em dizer que as duas expressões estão corretas. No singular, o "se" é o sujeito indeterminado, ao modo do francês "on" (on vend des maisons), sendo portanto um pronome indefinido. Quando se usa no plural, o mesmo "se" passa a partícula apassivante, isto é, a frase deixa de ser ativa e torna-se passiva. Em "vendem-se casas", o sujeito é "casas", alterando-se a ordem das palavras: "casas são vendidas". Eu tinha para aí um livro com o título - Problemas do se - onde esta palavrinha era dissecada nas múltiplas aceções em que é usada. E muito se aprende com estas leituras. Abraço do António Henriques
Olá, António Henriques, boa tarde! Sobre português tudo és um barra. A minha contribuição é sempre no sentido de dar a conhecer o que aprendi e o que acho que está correcto. Neste caso de “vende-se andares” ou “vendem-se andares” estamos perante duas frases na voz activa. Os andares não se vendem a si próprios. Estão bem visíveis o sujeito, o predicado e o complemento. Eu referi, anteriormente, que havia explicações doutras pessoas baseados na “passiva”. Ora, vamos subentender…. O prof. Raúl Machado explicou isso tudo. Os argumentos dele já não recordo. Que pena não ter, pelo menos, tirado uma fotocópia da lição na RTP. Pode ser que apareça alguém que tenha. Se não, só nos arquivos da RTP ou na Sociedade da Língua Portuguesa, se ainda existir. Agora, quem tem as competências de língua portuguesa é a Sociedade de Ciências (será mesmo este o nome?! Fica ali perto do Coliseu e tem um belíssimo Dicionário de Português). Em anos posteriores ao “reinado” do prof. RaúlMachado têm aparecido várias explicações para o “vende-se e vendem-se”. Também tenho lido. Gostava de os ver confrontados com o prof. Raúl Machado, mas as pessoas não são eternas. Os mesmos temas ressuscitam anos mais tarde com outros protagonistas. Confirma-se que a língua portuguesa é mesmo assim. Tenho uma vaga ideia que o dicionário da Sociedade de Ciências, no “se”, diz que o correcto é o “vende-se”. Grande abraço, Tonho.
“Alugam-se quartos” A elaboração e utilização deste tipo de frases oferece-me sempre algumas dificuldades. Além disso, também não é fácil classificar o morfema “se”, dada a sua multiplicidade de significados: pronomes vários, partícula apassivante, partícula de realce, conjunções várias… No meu tempo de seminário chamava-se àquele “se” uma partícula apassivante porque a frase corresponde à forma passiva “Quartos são alugados”. Mas também se admitia que podia ser um pronome indefinido (“A gente aluga quartos” = “Aluga-se quartos”). Já então a questão era polémica e, pelos vistos, a controvérsia continua. Considerar o segundo caso (verbo no singular) como forma eventualmente correta talvez se deva ao facto de este “se” corresponder ao “on” francês: “On loue des chambres”. Refira-se também que em esperanto (língua planeada internacional, que privilegia a lógica), se usa o verbo no singular: “Oni luigas ĉambrojn”, construção análoga à francesa. Nos interessantes e bem elaborados comentários do Zé Maria Lopes, parece-me que a opinião do seu “mestre de Língua Portuguesa” não está correta ao afirmar que “o AQUI servia de sujeito no singular”, visto que um advérbio não pode ter aquela função sintática. Alcino Alves