Ai de ti, Jerusalém
Cidade santa e maldita
Nesta quadra pascal, em que Jerusalém se encontra no centro dos eventos relacionados com a paixão e morte de Cristo, pensamos ser oportuno, revisitar a longa e atribulada história de Jerusalém, espaço onde decorreram os últimos momentos da vida de Cristo, rejeitado e condenado à morte, pelo poder religioso (Templo) e político (Império Romano). De mãos dadas, tudo fizeram, para evitar distúrbios na cidade durante a Páscoa, para colocar um ponto final na vida de um novo líder espiritual, filho de um carpinteiro, oriundo da zona da Galileia. Numa altura em que a cidade acolhia multidões de judeus, para celebrar a sua grande festa anual da Páscoa, os poderes da cidade não podiam dar espaço a uma nova doutrina que podia dividir e exacerbar mais os judeus, com disputas entre os vários grupos de crentes. A todo o custo, era necessário manter-se a paz, durante estes festejos. Neste ambiente de cortar à faca tornava-se imperioso, preventivamente, prender e julgar o líder de uma nova doutrina e sentenciá-lo. A narração dos quatro evangelistas contam-nos o resto. Como se chegou a este episódio trágico, é o que sucintamente nos propomos explanar.
A história da cidade de Jerusalém, pela sua longa e atribulada longevidade, não é fácil de contar em poucas palavras. Apesar disso, tentemos revisitar alguns dos seus momentos mais significativos que foram marcando esta cidade, três vezes santa e maldita. Espaço de oração e de guerra. De construção e destruição. De liberdade e de opressão. De riqueza e de pobreza. Paradoxalmente, cidade dita de paz, mas em guerra. De Deus e do diabo. Compreender Jerusalém e as suas contradições, não é tarefa fácil.
Por isso, revisitar momentos da sua história, poderá ajudar-nos a compreender melhor a sua situação atual, onde cada pedaço da sua terra é disputado, palmo a palmo, pelas três religiões monoteístas: cristãos, judeus e muçulmanos.
A primeira ocupação humana desta Jerusalém remonta a 3.500 a.C.. No séc. X a.C., o poderoso rei David escolheu-a para ser capital e, pouco depois, seria o opulento rei Salomão a construir o seu primeiro majestoso Templo, centro da vida espiritual dos judeus.
Este seria destruído em 586 a. C. por Nabucodonosor, rei da Babilónia que deportou os judeus para o seu país. Só regressarão com o rei Persa, Ciro, que lhes permitiu a reconstrução de um novo Templo. No ano 63 a.C., são os romanos a conquistar a cidade, transformando-a numa província romana. No ano 20 a. C, sob este domínio, o rei Herodes, sujeito aos romanos, fez do Templo um monumento de novo importante e grandioso. Cerca do ano 30, Jesus de Nazaré foi crucificado sob a ordem de governador romano Pôncio Pilatos, o tal que lavou as suas mãos.
No ano 70, os romanos destruíram, novamente, o Templo de Jerusalém. Em 325, Constantino construiu a Igreja do Santo Sepulcro. Chegados a 636, Jerusalém será conquistada pelo califa Omar, que construiu em 691 a casa do Rochedo e 10 anos depois, a esplendorosa mesquita al-Aqsa, sobre a esplanada do antigo Templo de Salomão. Séculos mais tarde, disputam a cidade os cristãos – as Cruzadas - em ação, conquistando a cidade em 1.099. Massacrados e dispersos os judeus, só regressariam em1187 som o domínio muçulmano do sultão Saladino o qual autorizou o seu regresso. Seguiu-se o domínio Mongol e Otomano, antes de ser colocada sob mandato britânico em 1917, após a 1ª guerra mundial. Em 1947, a Palestina é partilhada por dois Estados – Israelita e Palestiniano. Em 1967, com a guerra dos seis dias, Israel tomou posse de Jerusalém. Em 1980, Israel faz de Jerusalém (zona oeste e este) a sua capital. Esta decisão não foi aceite pela comunidade internacional. Apesar disso, em 2017, Donal Trump, presidente da USA, reconheceu Jerusalém capital de Israel, contra o aviso da ONU, ameaçando transferir a embaixada americana de Telavive para Jerusalém. A polémica continua em aberto.
Hoje, neste pequeno espaço, vivem católicos, ortodoxos (em maioria) vindos sobretudo da Rússia, siríacos, etíopes, coptas e caldeus, embora seja uma minoria da população, com apenas 3%. A maioria é muçulmana, com 72%. A restante é judaica, sobretudo ortodoxa. Este ambiente, por vezes, torna-se escaldante, com pedras e balas a voarem pelos ares, resultando mortos e feridos, de ambos os lados da contenda.
Agora, podemos compreender melhor as palavras de Cristo proferidas quando se aproximou da cidade, chorando sobre ela, proclamou: “ai de ti, Jerusalém!”.
Boas Festas.
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