FINALISTAS DE PORTALEGRE – 1958
MAIS UMA ESPECTACULAR REPORTAGEM! VALE A PENA LER...
O Fernando Leitão já nos habituou a estes mimos, a este olhar para o passado com respeito e com graça. AH
1.Cerimonial de conclusão de curso
Em Maio de 58 concluía-se o nosso percurso académico de 12 anos. A celebrar esta etapa de vida havia a Eucaristia solenizada, na parte da manhã e, de tarde, sessão de despedida e Te Deum. Na sessão eram oradores para além de um membro do corpo docente, um elemento do curso anterior, responsável pela organização do evento, a quem competia a elaboração do opúsculo de caricaturas, da autoria do Libânio Martins e um finalista que haveria de focar aspetos da longa caminhada. Tivemos o cuidado de não repetir a expressão do ano anterior, proferida pelo Lobato Novo e que causara um mal-estar no corpo docente: “…O pouco que sabemos a vós o devemos”…
O almoço era esmerado, com ementa em latim macarrónico, concebida pelo criativo Chico Cristóvão, que incluía doces da Pastelaria Império de Cernache, oferta da proprietária, minha irmã e espumante de Caves de Anadia, como constava na lista “ex domo csatum est domine doctor”. Só o Cristóvão nos poderá explicar este arremedo latinório. Gostaria de a partilhar aqui na íntegra, mas a minha memória só reteve este fragmento.
2. Em oração em Fátima
Dos nossos Superiores conseguimos autorização para uma viagem a Fátima e posterior roteiro indefinido, que não teve oposição quando dissemos que o Pe. Santiago, prior de Urra, seria o nosso motorista com a cedência de sua carrinha.
Na foto, a partir da esquerda estão: Francisco Belo(Crato), Amândio Tomé (Sarnadas de S. Simão), Francisco Cristóvão (Carapalha-Castelo Branco), Pe. Santiago(Urra), Fernando Leitão(Cernache), Júlio Cardoso Alves (Pergulho-Proença-a-Nova). Estranho não aparecer o Alberto Jorge. Terá sido o fotógrafo de serviço?
Os dois primeiros já nos deixaram. Quanto sofri por não ter sido informado de sua morte! Desejaria acompanhá-los nesta outra viagem. Fui explicar a minha ausência, deixar uma flor e oração nas campas que, mais tarde, visitei. O Belo tinha uma grande devoção à Senhora de Fátima e a sua imagem acompanhou-o sempre ou na carteira ou na mesa de trabalho. De realçar também a sua admiração pelos Papas. Tantas vezes ele ilustrou pergaminhos, a tinta da china, verdadeiras iluminuras, com boas obras e orações de todos nós e que oferecíamos ao Santo Padre por ocasião de seu aniversário!
Concluíram o curso, mas não avançaram para a ordenação o Cristóvão e o Júlio.
Este esteve no Pego, a meu pedido, para advogar um pegacho que havia sido demitido da sua atividade de metalúrgico. Em Tomar, no dia do julgamento, no Tribunal de Trabalho, descobrimos, com grande surpresa, que era juiz o nosso colega de curso, Abílio Cardoso(Maljoga), alcunhado no Seminário, de “galinha”, por olhar de lado.
3. Montemor-o-Velho e o ciclismo
Depois da oração na capelinha das aparições rumámos à Figueira da Foz, onde se tirou a foto anexa, seguindo daí para Montemor para o Stand/Oficina de bicicletas de Alves Barbosa (pai). O Pe. Santiago relacionava-se com ele porque era amante do ciclismo. Não havia festa na paróquia que não incluísse uma prova desta modalidade desportiva. Na altura o filho havia abandonado o Tour de France por motivo de doença. Visitámo-lo no quarto, onde recuperava. Alves Barbosa era o grande ciclista na altura. Correu sempre pelo Sangalhos e foi o 1º português a vencer por três vezes a volta a Portugal, tendo ainda marcado presença quatro vezes na volta à França, três vezes em Espanha e duas em Marrocos e Andaluzia. Terminou a carreira em 1962 e a Edilidade perpetuou a sua memória com o seu busto.
4. Queimas das fitas e das faixas verdes
O nosso próximo destino viria a ser Coimbra, capital do conhecimento, em grande agitação com a queima das fitas. Pela 1ª vez presenciámos este espetáculo de cor, diferente para cada faculdade e o desfile dos carros alegóricos com mensagens mais viradas para a vida académica, já que a situação política de então impedia referências à crise vigente e aos problemas sociais do país. Deslumbrados com esta manifestação de vida académica, nasceu em nós o compromisso de fazermos algo semelhante em Portalegre. Não haveria fitas a queimar, mas alguém sugeriu: por que não as faixas? O modelo seria diferente. Cada um procuraria descobrir no seu percurso de seminarista um pormenor digno de registo e de partilhar.
No Seminário havia uma dependência com roupas garridas da Caritas que cada um aproveitou para a sua melhor indumentária. Só os finalistas vestiam batina e faixa. No dia aprazado lá saímos a terreiro, em grande alvoroço, com as risadas provocadas pela originalidade de cada mensagem. Não havia carros alegóricos, mas do Sr. Domingos conseguimos a cedência do burro e do cão, com quem tínhamos estabelecido um pacto de sã convivência. Os finalistas ladeavam o burro, talvez a querer lembrar algumas das burrices do percurso e de orelha a orelha o escrito: ”Ó Pereira, és mesmo um bruto”! disse um dia o Pe. Marujo, em Alcains, quando me apanhou empoleirado num damasqueiro (ele nunca acertava com o meu nome). O cão ia muito calmo, à trela e o dístico “Ciência que não vem nos livros” episódio já dado a conhecer. Outro levava num dos pratos da balança um grande prato e no outro dois muito pequenos, a recordar outra história aqui já contada. Lembro o colega que tinha apanhado cinco valores a Direito Canónico e para recordar a desgraça mandou vir uma bicicleta da cidade em que circulava no queimódromo com a seguinte inscrição na camisola: “velocidade máxima 5 e sempre a direito”. Muitas outras mensagens havia até a provocar as risadas dos professores que acompanharam o desfile pelo passeio e que estão esquecidas. Pena foi o operador de imagem, o Chamiço, ter dado sumiço à cassete e nada ter ficado para memória futura.
Fernando Cardoso Leitão Miranda