PALAVRA DO SR. BISPO
Uma reflexão límpida, leve de leitura mas profunda no pensamento, sobre Tomás Moro, o seu tempo e os nossos dias. Vale a pena ler a palavra do nosso bispo. AH
AVE RARA NO BANDO DA GOVERNANÇA – 30-09-2016
Tomás nasceu no seio de uma família cristã, em Chelsea, Londres. Aos 22 anos era já doutorado em Direito e um professor de referência. Intelectual brilhante, de muitos saberes e cultura, Tomás tinha uma personalidade simpática, um excelente bom humor, uma formação cristã invejável. Casou-se, ficou viúvo, voltou a casar, teve quatro filhos. Seu Lar era uma pequenina igreja, dava-se tempo à oração e ao aprofundamento na fé. A paróquia era ponto de referência diário.
Humanista, político e literato, foi grande o seu contributo à causa pública e à literatura universal. Escreveu obras de referência, a “Utopia” é uma delas. Foi membro do Parlamento, do Conselho da Coroa, presidente da Câmara dos Comuns. Eleito Chanceler do Reino, serviu dedicadamente o rei e o país, a justiça e o bem comum. Defendeu a família e os seus valores, promoveu a educação da juventude, desdenhava honras e riquezas, teve carreira de sucesso.
Como sabemos da História, Henrique VIII desejava um filho varão para lhe suceder, não uma mulher. Porque Catarina de Aragão não lho dava, e acreditemos que era só por isso, quis divorciar-se para casar com Ana Bolena. A controvérsia foi grande: envolveu a Igreja, a Inglaterra e parte do mundo. Já que Roma permanecia firme em relação à indissolubilidade do matrimónio, o rei, para levar a água ao seu moinho, serve-se dum Parlamento subserviente. Curvado à sua vontade, aprova decretos em conformidade, faz publicar o Ato de Supremacia, no qual, negando-se ao Papa qualquer autoridade, proclama o rei e os seus sucessores como chefes temporais da Igreja de Inglaterra. Quem se negasse a fazer o juramento de fidelidade a tal supremacia, quem não reconhecesse como verdadeiro casamento a sua união com Ana Bolena, seria considerado traidor, réu de morte. Por ironia do destino, e devido às suas aventuras, Ana Bolena acabaria também por ser decapitada. Mas o rei, nesta questão de senhoras, também era uma espécie de borboleta a saltitar de flor em flor.
Destes encontros e desencontros, nasce a igreja anglicana, separada de Roma, com muito sangue e sofrimento para se implementar. O monarca reprimiu as revoltas populares, convenceu o povo da justeza das suas opções, destruiu igrejas, despejou mosteiros, levou líderes ao pelourinho, prendeu-os, mandou-os matar. Entre eles estava um respeitável Lord, o chanceler do reino, Tomás Moro, católico esclarecido e de garra que não aceitava alienar, nem sequer ferir, a sua própria consciência. Sempre dedicado e leal ao rei, grande figura do reino e da corte, não foi na onda. Renunciou a todos os seus cargos, negou-se a jurar o Ato de Supremacia, defendeu as suas convicções sobre a família, o matrimónio católico e os valores cristãos. Foi preso, sujeito a pressões, condenado à morte e decapitado em 6 de julho de 1535, por vingança pessoal do rei. A sua cabeça esteve exposta na ponte de Londres durante um mês. No momento antes de ser executado, afirmou ao carrasco: “… morro na fé e pela fé da Igreja de Roma e morro fiel servidor de Deus e do rei, mas primeiro de Deus…”.
Foi canonizado, por Pio XI, em 1935. A pedido de personalidades de variada proveniência e após madura reflexão, João Paulo II, no ano 2000, constituiu-o e declarou-o Patrono dos Governantes e dos Políticos. E justificava: “Muitas são as razões em favor da proclamação de S. Tomás Moro como Patrono dos Governantes e dos Políticos. Entre elas, conta-se a necessidade que o mundo político e administrativo sente de modelos credíveis, que lhes mostrem o caminho da verdade num momento histórico em que se multiplicam árduos desafios e graves responsabilidades. Com efeito, existem, hoje, fenómenos económicos intensamente inovadores que estão a modificar as estruturas sociais; além disso, as conquistas científicas no âmbito das biotecnologias tornam mais aguda a exigência de defender a vida humana em todas as suas expressões, enquanto as promessas duma nova sociedade, propostas com sucesso a uma opinião pública distraída, requerem com urgência decisões políticas claras a favor da família, dos jovens, dos anciãos e dos marginalizados”.
Há tempos, o Papa Francisco respondia a alguém: “Para o cristão, é uma obrigação envolver-se na política… a política está muito suja; e ponho-me a pergunta: Mas está suja, porquê? Não será porque os cristãos se envolveram na política sem espírito evangélico? …”.
ANTONINO DIAS