Pobre país
"Uma saúde gripada não serve a ninguém..."
Saúde (en)gripada
Muitos portugueses, nos últimos tempos, têm experimentado dois espinhosos incómodos. A crescente degradação dos centenários serviços dos CTT, agora privatizados, e as urgências de hospitais, a rebentar pelas costuras, por força de uma moderada crise gripal. Detenhamo-nos nesta última situação, tentando indagar as suas raízes e os possíveis remédios para a tentar prevenir e debelar. Trata-se de uma situação grave, relacionada com o bem-estar geral da população. Sobretudo, a mais doente e a mais idosa.
Como sabemos, todos os problemas sociais têm as suas causas. Algumas, mais longínquas, estruturais, outras mais recentes, conjunturais. No caso vertente, podemos enumerar as que se relacionam com a falta de investimento nesta área, sobretudo no tempo da malfadada troyka que nos sangrou durante uma mão cheia de anos. Esmifrado que foi o investimento neste importante sector da vida das pessoas doentes, tem tardado a cobrir o buraco aberto nas dívidas acumuladas no Ministério da Saúde.
Acresce ainda o facto de, nos últimos anos, terem emigrado alguns milhares de profissionais da saúde, sobretudo, enfermeiras e médicos para vários países, como a Inglaterra, países árabes e Bélgica. É todo este numeroso contingente de profissionais - formados com os nossos impostos - que agora nos começam a faltar, para fazermos face a algumas crises nos hospitais e centros de saúde. Deste modo, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) considerado internacionalmente, como um dos melhores da Europa, nos últimos anos, tem-se vindo a degradar com tanta rapidez, numa erosão preocupante, que não se podem aguardar dias risonhos, se nada for feito já, para lhe fazer face.
Encontra-se à vista da população em geral a degradada situação que ocorreu nas últimas semanas, com a chegada espectável de uma crise gripal, que deixou as urgências de alguns hospitais de pantanas. Falta de camas, de médicos e enfermeiros, tanto nos hospitais, como nos centros de saúde, com numerosas macas amontoadas, nos desconfortáveis corredores das urgências. Não faltando as imagens televisivas chocantes. Face a este degradado panorama, podemos concluir, com total segurança, que o nosso SNS não se encontrava preparado para responder a esta crise. Como aconteceu no verão, com a maldição dos fogos, a prevenção dos problemas não será o nosso título de glória. Pelo contrário, o Estado, quase sempre, costuma correr atrás do prejuízo, em lugar de prevenir situações problemáticas espectáveis.
O diagnóstico sobre esta nossa recente incapacidade. já se encontra efetuado. A falta de recursos públicos e materiais tem sido a grande falha apontada pelo sindicato dos enfermeiros portugueses, relativamente à incapacidade demonstrada pelo Governo, na solução atempada dos normais problema de saúde pública.
A esta degradada situação, se fica a dever a morte de alguns doentes, sobretudo pessoas idosas, por vezes, com patologias cruzadas complexas. Algumas delas depositadas em contentores, por falta de espaços dignos em hospitais que tiveram de fechar enfermarias.
Como consequência destas situações degradantes, acresce ainda que vai tardar que os hospitais regressem ao seu normal, uma vez que, em virtude desta situação de crise, os hospitais foram impelidos a ter de adiar cirurgias.
Sabemos ainda que, em apenas em duas semanas, os hospitais de Lisboa foram obrigados a atender cinco mil consultas. Devido a esta avalanche, doentes houve que tiveram que ser encaminhados para hospitais privados, devido à incapacidade dos públicos em os acolher.
Segundo alguns peritos, o remédio para debelar estas situações de número excessivo de doentes que acorre aos serviços de urgência estará relacionada com a falta de literacia da população, à falta de consultas disponibilizadas nos centros de saúde, onde não há exames complementares de diagnóstico e com horários laborais reduzidos. Acresce ainda à perceção de muitos em considerarem que há uma falta de credibilidade nas consultas efetuadas nestes locais. Urge assim uma educação da população para saber lidar com as alternativas que se lhe oferecem, para responderem aos seus problemas de saúde. Para o Estado e o governo, sobra o dever da promoção da informação à população, para que recorra ao SNS, procurando a resposta mais adequada para os seus problemas. Mas, enquanto os centros de saúde não tiverem capacidade de oferecer uma resposta rápida e eficaz à população, as urgências continuarão a ser a opção mais prática e acessível, com todas as consequências negativas daí derivadas. Uma saúde gripada não serve a ninguém.
florentinobeirao @hotmail.com